Sutra:
Se
você não aprecia o que não tem utilidade, não pode começar a falar do que pode
ser útil.
A
terra, por exemplo, é ampla e vasta, mas de toda a sua extensão, o homem
utiliza apenas alguns centímetros sobre os quais ele se mantém de pé.
Suponhamos
agora que você tire tudo o que ele na verdade não está usando, de modo que, em
torno de seus pés, um abismo se abra, e ele fique de pé no vazio.
Sem
nada sólido, a não ser o que se encontra sob cada pé, por quanto tempo ele vai
ser capaz de utilizar o que está usando?
Esta é uma bela metáfora. Você está
deitado aqui, está usando apenas um espacinho, de dois por dois. Você não está usando
toda a terra, toda a terra é inútil, você está usando uma pequena porção, dois
por dois.
Suponhamos que apenas isso lhe reste e
toda a terra tenha sido retirada – quanto tempo você vai ser capaz de usar essa
pequena parte?
Um abismo, um abismo infinito, se
abrirá em torno de você – você vai ficar tonto imediatamente, você vai cair no
abismo. Perceba... A terra inútil suporta o útil e o inútil é vasto, o útil é
muito pequeno. E isso é verdade em todos os níveis do ser: Se você tentar
salvar o útil e esquecer o inútil, mais cedo ou mais tarde vai ficar tonto. E
isso já aconteceu, você está tonto e caindo no abismo.
A terra inteira foi tirada e você foi
deixado apenas com a parte onde está sentado, em pé ou deitado. Você está
ficando tonto. A toda a sua volta, você vê o abismo e o perigo; e você não pode
usar a terra em que está de pé agora, porque só poderá usá-la quando o inútil
se juntar a ela. O inútil deve estar lá.
E o que isso significa? Sua vida
tornou-se só trabalho e nenhuma brincadeira. A brincadeira é o inútil, o
grande; o trabalho é o útil, o trivial, o pequeno. Você tornou a sua vida
completamente cheia de trabalho.
E sempre que você começa a fazer algo,
a primeira coisa que vem à mente é: qual a utilidade disso¿ Se houver alguma
utilidade você faz.
Parece absurdo para nós ouvirmos isso,
mas isso já aconteceu em muitas dimensões da vida. Você nunca brinca, seus
empregados estão fazendo isso. Você nunca é um participante ativo em qualquer
diversão, outros estão fazendo isso por você. Você vai ver um jogo de futebol:
outros estão jogando e você apenas assistindo – você é um espectador passivo,
não envolvido. Você vai ao cinema para ver um filme e outras pessoas estão
fazendo amor, violência, guerra – tudo -, você é apenas um espectador na
cadeira. É tão inútil que você não precisa se preocupar em fazer aquilo.
Qualquer um pode fazer, você pode apenas assistir.
O trabalho você faz, os outros estão
se dedicando à diversão para você. Então por que não o amor¿ - A mesma lógica
se aplica, alguém vai acabar fazendo isso com seu parceiro ou sua parceira por
você, você está muito ocupado.
A vida parece sem sentido, porque o
significado consiste num equilíbrio entre o útil e o inútil. Mas você negou
completamente o inútil. Você fechou a porta. Agora, apenas o útil está
presente. O útil se tornou um fardo, você está sobrecarregado demais por ele.
É um sinal de sucesso se, por volta
dos 40 anos de idade, você já estiver tomando anti-depressivos ou se tiver
úlceras. Aos 50 já deve ter sofrido o primeiro ataque cardíaco. Aos 60, ele
morre – sem nunca ter vivido. Não houve tempo para viver. Ele tinha tantas
coisas importantes para fazer, não havia tempo para viver.
Olhe ao redor e veja as pessoas bem
sucedidas – o que está acontecendo com eles? Não olhe para as coisas que
possuem, olhe-os diretamente, porque se você olhar para as coisas, você vai se
deixar enganar, porque as coisas não têm úlceras, os carros não têm ataques
cardíacos... Olhe para a pessoa e você vai sentir a pobreza. Então, mesmo um mendigo
pode ser um homem rico, no que diz respeito à vida.
Perceba... O eu interior está sendo
perdido em troca de bens fúteis. Você pode enganar os outros, mas como vai ser
capaz de enganar a si mesmo? No final, você vai olhar para a sua vida e vai ver
que você a perdeu por causa do que é útil.
O inútil deve estar presente. O útil é
como o jardim, bem arrumado, limpo; o inútil é como uma vasta floresta,
natural, não pode ser tão limpo e arrumado. A natureza tem sua própria beleza.
Quando tudo está arrumado e limpo, ele já está morto. Um jardim não pode ser
muito vivo, porque você vai podá-lo, cortá-lo, administrá-lo. Uma vasta
floresta tem uma vitalidade, uma alma muito poderosa.
Entre numa floresta e você vai sentir
o impacto; perca-se numa floresta e você vai sentir o poder que ela tem. Num
jardim você não pode sentir o poder; ele não está lá, o jardim é feito pelo
homem. Você pode olhar para ele – ele é cultivado, ele é administrado,
manipulado.
Enfim, se você puder brincar, o seu
trabalho vai se tornar um prazer. Se você puder se entregar a uma simples
diversão, se você puder se tornar como crianças brincando, seu trabalho não
será um fardo para você. Mas é difícil. Sua mente continua pensando em termos
de dinheiro.
O dinheiro parece ser a única coisa
útil. Todos aqueles que são utilitaristas são loucos por dinheiro, porque o
dinheiro pode comprar. O dinheiro é a essência de toda a utilidade. Então, se
Buda e as pessoas como Buda renunciaram, não foi porque eram contra o dinheiro,
foi porque eram contra a utilidade, contra o útil. Então elas disseram: “Fiquem
com todo o seu dinheiro. Estou indo para a floresta. Este jardim não é mais
para mim. Vou explorar o vasto, o desconhecido, onde podemos nos perder. Este
caminho arrumado e limpo, onde tudo é conhecido, mapeado, não é para mim”.
Quando você entra na vastidão da
inutilidade, sua alma se torna grande. Quando você vai para o mar, sem mapa,
você se torna como o oceano. Então o próprio desafio do desconhecido cria a sua
alma.
Quando você está seguro, quando não há
problema, quando tudo está matematicamente planejado, estabelecido, a sua alma
se encolhe – não há desafio para ela.
O inútil confere o desafio. Por hoje
basta.
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